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segunda-feira, 31 de agosto de 2015

A radiação terahertz

Apesar de ainda pouco explorada, a radiação terahertz já fornece mostra de sua potencialidade em análises de materiais e obtenções de imagens.

quadro Marinha

© Virgilio Guidi (quadro Marinha)

Nada substitui o olho de um especialista para avaliar as particularidades de um quadro. Mas o emprego em importantes museus e instituições culturais do país de uma série de análises físicas e químicas tornou-se uma ferramenta adicional para entender o estilo e o processo criativo de certos pintores, dar parâmetros ao trabalho de conservação e restauração e trazer à tona facetas ocultas de algumas pinturas. Nesse sentido, a história do quadro Marinha, um óleo sobre madeira produzido provavelmente no início da década de 1940 pelo italiano Virgilio Guidi (1891-1984), é bastante ilustrativa. No catálogo do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), onde se encontra guardada, essa tela abriga, oficialmente, apenas uma pintura: uma vista do Grande Canal de Veneza, com destaque para a Igreja de San Giorgio Maggiore. No entanto, basta virar o quadro para ver, a olho nu, em seu verso o retrato de uma mulher. Imagens no infravermelho desse lado B da tela revelaram uma terceira pintura escondida sob as tintas que deram forma à figura feminina: outra cena marítima da cidade italiana.

Os raios X, raios gama, raios ultravioleta, raios infravermelhos e micro-ondas representam diferentes formas de radiação eletromagnética. A radiação infravermelha se manifesta sob a forma de calor.

No espectro eletromagnético, entre a faixa das micro-ondas e do infravermelho existe uma zona pouco explorada científica e tecnologicamente, a radiação terahertz gerada pelos raios T.

O nome vem da faixa de frequências dessa radiação, entre 0,3 e 3 THz (terahertz ou trilhões de hertz). Em termos de comprimento de onda, os raios T vão de 1.000 a 100 micrômetros.

Depois de muitas e infrutíferas tentativas de aproveitamento dos raios T, parece que agora há indícios de que teremos finalmente a exploração da última fronteira de pesquisa em eletrônica de alta frequência.

Há quase 90 anos, mais precisamente em 1923, E. F. Nichols e J. D. Tear publicaram um artigo com o sugestivo título “Unindo os espectros do infravermelho e das ondas elétricas”.

Desde então, físicos e engenheiros têm preconizado uma “nova era” para essa fronteira entre o infravermelho e a micro-onda, para logo depois se depararem com resultados pífios.

Os desenvolvimentos científicos e tecnológicos nos dois lados da fronteira têm sido notáveis, tais como os artefatos modernos: forno de micro-ondas, telefones celulares, telefones sem fio e GPS.

No lado do infravermelho, não é menos notável o desenvolvimento tecnológico, muitas vezes impulsionado por interesses militares. Entre as inúmeras aplicações civis, podemos destacar aquelas relacionadas a pesquisas em astronomia, em química e na análise de objetos de arte, sobretudo pinturas.

Enquanto a micro-onda, com frequência na faixa do gigahertz, é capaz tão somente de produzir rotações nas moléculas, a parte superior do infravermelho, com frequência maior que 10 terahertz, é capaz de produzir vibrações, resultantes de interações intermoleculares.

Já a radiação terahertz faz as duas coisas simultaneamente. A análise com raios T permite, ao mesmo tempo, a análise de materiais quanto à sua estrutura molecular, assim como a análise com micro-onda, e quanto à sua composição química, do mesmo modo que a análise com infravermelho.

Esse comportamento extremamente interessante é conhecido desde os anos 1920, mas foi necessário esperar por uma ideia bastante criativa para que feixes de raios T com alta luminosidade e grande faixa de frequências pudessem ser produzidos.

Uma ideia inovadora, originada nos laboratórios Bell, no final dos anos 1980, utilizou um laser de femtosegundos (femtosegundo é um quadrilionésimo de segundo). Quando um pulso emitido pelo laser atinge uma antena fotocondutiva, material que emite pulsos elétricos quando iluminada, também inventado pelos pesquisadores da Bell, o resultado é a emissão de pulsos com frequências entre 300 gigahertz e 10 terahertz.

Tão interessante quanto isso é o fato de que pequenas modificações técnicas na estrutura do circuito transformam uma antena emissora em receptora, dois elementos importantes para o funcionamento de um equipamento de raios T.

Seu alto poder de penetração em materiais desidratados, não-metálicos, plásticos, papéis e cartolinas e sua impenetrabilidade em materiais metálicos e líquidos polares como a água fazem da radiação T uma excelente ferramenta para obtenção de imagens, uma das aplicações mais extasiantes da atualidade.

Quando o feixe do laser atinge a antena emissora constituída de material fotocondutor, produz pulsos de raios T, os quais são modificados, em sua forma e frequência, em decorrência da interação com o material da amostra. Um sistema eletrônico convencional transforma os sinais elétricos produzidos pela antena em imagens.

Um cálculo simples mostra a eficiência desse sistema de aquisição de imagem com raios T. Antes do uso do laser de femtosegundo e das antenas fotocondutivas, seriam necessários 15 dias para a obtenção de uma imagem de 100 pixel x 100 pixel com raios T. Com o sistema desenvolvido pelo pessoal da Bell é possível analisar 100 pixels por segundo, de modo que a imagem de 100x100 é obtida em pouco mais de 1 minuto.

Muitos dos resultados de aplicações analíticas da radiação T são similares àqueles obtidos com o infravermelho. Já nas aplicações com imagens, além das duas formas de radiações eletromagnéticas, os raios X aliam-se na concorrência.

Os pesquisadores da Universidade de Tecnologia de Delft, na Holanda, mostraram como os raios T podem ser utilizados, de modo não destrutivo, para determinar espessuras de camadas de tinta abaixo de uma pintura, algo impossível com o uso de raios X ou infravermelho.

Ao contrário dos raios X, os raios T não ionizam o material analisado e, ao contrário do infravermelho, não o aquece por causa da baixíssima intensidade necessária para a realização das análises.

Apesar de todas as vantagens apontadas até aqui, ainda há uma séria limitação a ser superada nos atuais equipamentos: a baixa resolução espacial. A resolução espacial dos equipamentos atuais está na faixa do milímetro, ou seja, objetos na escala micrométrica não são bem identificados.

Aumentar a resolução espacial dos equipamentos de raios T é, portanto, um efervescente desafio de pesquisa, que poderá fazer com que a radiação terahertz seja digna dos sonhos dos pesquisadores da área.

Recentemente, Godfrey Gumbs e seus colegas da Universidade Cidade de Nova Iorque idealizaram um dispositivo que permite converter uma corrente contínua, como a armazenada em baterias, em uma fonte ajustável de radiação terahertz.

O dispositivo é baseado nos plásmons de superfície, ondas de elétrons que se formam na superfície dos metais. Foi idealizado um semicondutor híbrido: uma camada mais grossa de um material eletricamente condutor envolvida por duas camadas muito finas, que podem ser de grafeno, siliceno, ou mesmo de um gás.

Quando a corrente contínua passa através desse sanduíche, ela cria uma ressonância plasmônica com um comprimento de onda muito específico, que induz a emissão da radiação terahertz, que pode então ser "coletada" por uma antena em forma de grade.

Ajustando os vários parâmetros, como a densidade do semicondutor híbrido ou da corrente contínua aplicada, é possível ajustar o comprimento de onda, ou seja, a frequência da radiação terahertz produzida.

"Nossa abordagem baseada em semicondutores híbridos pode ser generalizada para incluir outros materiais bidimensionais emergentes, tais como o nitreto de boro hexagonal, a molibdenita e o disseleneto de tungstênio," disse o professor Andrii Iurov, coordenador da equipe.

Um artigo intitulado “Tunable surface plasmon instability leading to emission of radiation”, que descreve a converção de uma corrente contínua em uma fonte ajustável de radiação terahertz, foi publicado no Journal of Applied Physics.

Fonte: Ciência Hoje e Pesquisa FAPESP

sábado, 2 de maio de 2015

Descoberto monopolo no campo quântico

Pesquisadores da Universidade de Aalto (Finlândia) e Amherst College (EUA) tem observado um monopolo no campo quântico pela primeira vez.

ilustração de um monopolo no campo quântico

© Heikka Valja (ilustração de um monopolo no campo quântico)

Esta descoberta se conecta às características importantes do elusivo monopolo magnético. Os pesquisadores realizaram um experimento em que manipularam um gás de átomos de rubídio preparados em um estado não imantado perto da temperatura do zero absoluto. Sob estas condições extremas foi possível criar um monopolo no campo da mecânica quântica que descreve o gás.
"Neste estado não magnético, foi criada uma estrutura no campo descrevendo o gás, assemelhando-se ao monopolo magnético, conforme descrito nas grandes teorias unificadas da física de partículas. Anteriormente, foi utilizada um gás para detectar um monopolo dentro de um chamado campo magnético sintético, mas não houve a ocorrência de monopolo no campo quântico que descreve o próprio gás. Agora finalmente testemunhamos a existência do monopolo da mecânica quântica!", alega o Dr. Mikko Möttönen da Universidade Aalto.

condensado de Bose-Einstein contendo o monopolo

© U. Aalto (condensado de Bose-Einstein contendo o monopolo)

A imagem acima mostra um condensado de experimentalmente criado de Bose-Einstein contendo um monopolo (à esquerda) e a previsão teórica correspondente (à direita). Área mais clara tem maior densidade de partículas e as diferentes cores indicam o estado de rotação interna dos átomos. O monopolo está localizado no centro do condensado.

No estado não magnético do gás, não há remoinhos quânticos ou monopolos que são criados no campo magnético sintético. Entretanto, a ordem magnética prevalece na amostra no campo da mecânica quântica, e os cientistas foram capazes de manipular isso com ajustes para um campo magnético aplicado externamente.
"O controle desses campos magnéticos deve ser estável a uma pequena fração do tamanho do campo magnético da Terra", acrescenta o Prof. David Hall do Amherst College. "O principal desafio experimental que enfrentamos foi preparar o gás criogênico em condições altamente sensíveis, em que as flutuações do campo devido ao movimento de objetos metálicos ou variações de linha de energia podem propiciar a observação dos monopolos difíceis".
O resultado é um notável avanço na pesquisa na área quântica. É importante compreender a estrutura dos monopolos e outras entidades topológicas, porque elas aparecem nos modelos que descrevem o Universo precoce e afeta as propriedades de muitos materiais diferentes, tais como os metais.
A descoberta de uma partícula de monopolo magnético poderá ocorrer no futuro. Este novo resultado estabelece que a estrutura de um monopolo na mecânica quântica pode ser exibido na natureza e, portanto, suporta ainda a possibilidade de que existem monopolos magnéticos.

Fonte: Science

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Monopolos magneticos sintéticos são gerados

Um análogo de uma partícula compreendendo um pólo magnético isolado tem sido observada por físicos nos EUA e Finlândia.

ilustração de um monopolo magnético sintético

© Heikka Valja (ilustração de um monopolo magnético sintético)

Os monopolos magnéticos foram previstos por Paul Dirac em 1931, mas nunca foram vistos na natureza. Este último trabalho não prova a existência das partículas incomuns, mas mostra que um sistema físico descrito por uma matemática subjacente pode ser criado em laboratório. A pesquisa também pode ajudar os físicos a obter uma melhor compreensão de materiais exóticos, como supercondutores, e até mesmo criar materiais com propriedades novas e úteis.
Os pólos magnéticos são sempre visto em pares, não importa quão pequeno é o ímã. Um ímã de barra comum consiste de um pólo norte e um pólo sul; se o ímã é cortado em dois, em seguida, cada uma das metades resultantes também será bipolar. Na verdade, não importa quantas vezes o ímã é dividido, os pólos norte e sul permanecem acoplados, inclusive em átomos individuais, que agem como minúsculos ímãs. Isso se reflete nas equações de Maxwell, que dizem que cargas elétricas positivas e negativas isoladas existem, mas as cargas magnéticas isoladas não ocorrem na natureza.
Isso mudou quando a mecânica quântica foi formulada no início do século 20. Paul Dirac mostrou que para ocorrer naturalmente monopolos magnéticos exigiria carga elétrica em unidades discretas. Esta singularidade é visto na natureza, mas não é totalmente compreendida, e a busca de monopolos magnéticos é um campo ativo de pesquisa.
Até agora, os físicos têm tentado criar monopolos dentro de aceleradores de partículas, mas a massa do monopolo é geralmente considerada muito alta para permitir uma observação, mesmo a do Large Hadron Collider (LHC) do CERN. Outra opção era procurar ambientes imaculados, como a Lua ou na gélida Antártida, para encontrar sinais dos monopolos que as teorias da grande unificação predizem deveria ter sido criado quando o Universo esfriou e sua simetria inicial foi quebrada. Aqui também, no entanto, os pesquisadores vêm-se de mãos vazias.
A abordagem de David Hall e seus colegas no Amherst College, em Massachusetts e colaboradores da Universidade de Aalto, na Finlândia é a produção de um análogo do que é conhecido como um "monopolo de Dirac", a forma da mecânica quântica generalizada de um monopolo magnético apresentada por Dirac. Antes de 1931, ninguém tinha sido capaz de combinar eletromagnetismo e mecânica quântica clássica para permitir a existência de monopolos magnéticos, mas Dirac foi capaz de fazer isso por considerar o que acontece quando um monopolo interage com um elétron. Ele descobriu que quando um monopolo passa por uma nuvem de elétrons - a distribuição no espaço de um único elétron , como descrito pela mecânica quântica - deixa um vórtice em seu rastro, é como o escoamento da água que flui pelo ralo.
O grupo de Hall que reproduziu um vórtice em um condensado de Bose-Einstein de átomos de rubídio ultra frios. O condensado é uma onda de matéria única e permanece na nuvem de elétrons de acordo com formulação de Dirac. Para reproduzir o monopolo, os pesquisadores aplicaram um campo magnético no condensado para orientar os átomos constituintes de tal maneira que foi criado um campo magnético "sintético"no interior do condensado. Existe uma correspondência entre esse domínio sintético e o campo que seria produzido por um monopolo magnético. "Você pode obter exatamente as mesmas linhas no campo sintético e o local do monopolo onde essas linhas de campo brotam", diz Hall.
Para mostrar que eles realmente tinham produzido um monopolo de Dirac, os pesquisadores injetou um feixe de laser através do condensado. O feixe criou uma radiografia, onde a sombra projetada pelos átomos da amostra foi perfurada por uma estreita faixa de luz. Isso foi o vórtice criado por um pólo norte isolado (sendo norte ao invés de sul simplesmente por razões técnicas). Normalmente um vórtice criado dentro de um condensado de Bose-Einstein vai de um lado do condensado para outro.

Peter Holdsworth, um físico da matéria condensada na Ecole Normale Supérieure de Lyon, elogia o trabalho como "uma aplicação requintada da nanotecnologia, átomos frios, computação de alta potência e teoria inteligente". Ele ressalta que a equipe não provou a existência de monopolos magnéticos, mas forneceu a confirmação experimental da matemática de Dirac. "É um resultado importante e poderia levar a muitos outros resultados análogo ", diz ele.

Isso vai ajudar os físicos de partículas encontrar monopolos reais? Provavelmente não, mas deverá incentivá-los a continuar a procurando.
Hall reconhece os limites do trabalho de seu grupo. "Nossos monopolos não seria registrado por uma bússola. Nós não temos sido capazes de reproduzir as propriedades como a massa da partícula em nosso experimento, mas criamos um análogo da parte magnética. Isso pode fornecer algumas dicas sobre monopolos naturais", diz ele.

Ele argumenta que seu grupo chegou mais perto de imitar supostos monopolos magnéticos naturais do que outros três grupos que relataram resultados em materiais conhecidos como spin gelados em 2009. Em trabalho anterior, as coleções em forma de tetraedros de íons que compõem spin gelados foram observados sob certas condições para a aquisição de giro líquido, de modo que se assemelha tanto ao norte isolado ou pólo sul. Hall descreve estas experiências interessantes, mas sustenta que a conexão com monopolos de Dirac era bastante fraca e o fenômeno em questão era puramente clássico, em oposição ao quântico.
Este trabalho pode ajudar os físicos a realizar simulações quânticas da matéria. Este campo de rápido crescimento tem como objetivo compreender os materiais existentes e, finalmente, criar novos, talvez até mesmo supercondutores a temperatura ambiente.

Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na revista Nature.

Fonte: Physics World

sábado, 14 de setembro de 2013

A borboleta fractal

Após uma busca de quase 40 anos, os físicos encontraram uma prova experimental para um dos primeiros padrões fractais conhecidos da física quântica: a borboleta de Hofstadter.

a borboleta de Hofstadter

© Douglas Hofstadter (a borboleta de Hofstadter)

Batizada em homenagem a Douglas Hofstadter, autor do livro Gödel, Escher, Bach, de 1979, ganhador do Prêmio Pulitzer, o padrão descreve o comportamento de elétrons em campos magnéticos extremos.
Para capturar a borboleta, os cientistas tiveram que inovar na construção de redes.
Desde maio, vários grupos vêm publicando experimentos que procuraram o padrão usando treliças hexagonais de átomos.
Em agosto, alguns cientistas relataram que estavam tentando captar o padrão com armadilhas de laser atômico. Alguns físicos afirmam que o estudo do padrão poderia ajudar no desenvolvimento de materiais com propriedades elétricas exóticas; mas a principal razão da busca foi verificar se a borboleta de fato tem o aspecto previsto.
“De início, o conceito de Hofstadter foi bastante perturbador para muita gente”, diz Cory Dean, um físico experimental no City College de Nova York. “Agora podemos dizer que sua proposta nem era tão louca assim”.
Hofstadter, que atualmente é um cientista cognitivo na Indiana University em Bloomington, esboçou o padrão nos anos 70 quando era um estudante de pós-graduação em física. Na época já se sabia que elétrons sob a influência de um campo magnético correriam em círculos, mas Hofstadter ponderou que, em teoria, se os elétrons estivessem confinados numa estrutura atômica cristalina, seus movimentos se tornariam complexos.
À medida que o campo magnético fosse incrementado, os níveis de energia que definem o movimento dos elétrons se dividiriam sucessivamente. Quando representados em um gráfico, esses níveis de energia revelaram um padrão que parecia uma borboleta e continuaram a fazer isso mesmo quando reduzidos a escalas infinitamente pequenas.
O matemático Benoît Mandelbrot ainda não tinha popularizado o termo “fractal” para esses padrões recursivos e o mentor de Hofstadter não se convenceu. “Ele desdenhosamente chamou o padrão de aninhamento que o novato alegava ter visto de ‘mera numerologia’”, conta o cientista. “Ele até me disse que eu seria incapaz de obter um PhD para esse tipo de trabalho”. Hofstadter publicou sua descrição da borboleta em 1976 após concluir seu doutorado.
A ideia era difícil de testar.
A força do campo magnético necessário depende do espaçamento entre os átomos na estrutura hexagonal (treliça). Em materiais convencionais, em que os átomos estão separados por menos de um bilionésimo de um metro, o padrão pode surgir somente em campos da ordem de dezenas de milhares de teslas. Os melhores ímãs disponíveis só conseguem chegar a cerca de 100 teslas e apenas por uma fração de segundo.
No entanto, campos menores têm suficientes treliças com espaçamentos maiores, que podem ser criados ao se empilhar materiais em camadas. Em maio, pesquisadores relataram que haviam colocado uma única folha de grafeno, em que os átomos de carbono estão dispostos como os alvéolos de um favo de mel, em cima de uma folha de nitreto de boro hexagonal (também com estrutura de favo).
As camadas criam um padrão repetitivo mais amplo para os campos magnéticos que os hexágonos existentes em cada material, magnificando efetivamente o campo.
Depois de submeterem o material a um campo magnético, os pesquisadores mediram alterações discretas na condutividade dele, com saltos que resultam de mudanças de nível de energia de seus elétrons.
Esses resultados não foram uma detecção direta do comportamento esperado de elétrons, mas uma simulação. 
A borboleta de Hofstadter ainda não tinha sido capturada, mas havia revelado sua existência. “Encontramos um casulo”, diz Pablo Jarillo-Herrero, um físico experimental no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em Cambridge. “Ninguém duvida de que há uma borboleta lá dentro”.
Wolfgang Ketterle, o Prêmio Nobel de Física de 2001, também do MIT, está “caçando” a borboleta de outro modo, ao fazer com que átomos ajam como elétrons. Para fazer isso, ele congela átomos de rubídio a alguns bilionésimos de grau acima do zero absoluto e usa lasers para prendê-los em uma estrutura com cavidades ou bolsas, como os de embalagens de ovos.
Quando atingidos por um par de lasers entrecruzados extras, os átomos fluem de uma cavidade para outra, como em um túnel. A inclinação da grade permite que a gravidade direcione os átomos para caminhos que imitam os movimentos circulares de um elétron em um campo magnético, embora não haja campos magnéticos reais envolvidos.
O sistema pode monitorar o movimento de átomos individuais facilmente e deveria ser capaz de imitar um campo magnético suficientemente forte para produzir uma borboleta de Hofstadter. “Átomos frios nos darão uma enorme liberdade”, afirma Ketterle.
Mas o arranjo tem um problema: os lasers tendem a aquecer os átomos frios, limitando a capacidade de controlar as energias das partículas e revelar o padrão fractal.
Ainda assim, se o calor puder ser controlado e a borboleta simulada, esse sistema poderia ser um ponto de partida para estudar comportamentos quânticos em sólidos, como materiais que conduzem eletricidade na superfície, mas são isolantes no centro.
Dieter Jaksch, físico da University of Oxford, no Reino Unido, observou: “Espero que uma infinidade de novos fenômenos sejam detectados quando se explorar a borboleta”.

Fonte: Nature

sábado, 7 de setembro de 2013

Matéria pode ter movimento perpétuo?

O físico Frank Wilczek teve que defender suas ideias mais de uma vez durante a sua longa e célebre carreira.

cristal do tempo

© NPL (cristal do tempo)

Diz ele que seu trabalho sobre quarks, os menores blocos de construção da matéria, que lhe rendeu o Prêmio Nobel em 2004, originalmente foi considerado “pouco convencional”.
Ainda assim, Wilczek, atualmente no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em Cambridge, foi pego de surpresa pela severidade de um ataque à sua mais recente proposta: um tipo de dispositivo em movimento perpétuo, chamado de cristal do tempo. Patrick Bruno, um físico teórico do Laboratório Europeu de Radiação Síncrotron (ESRF, na sigla em inglês), em Grenoble, na França, alega ter demolido a ideia com uma prova matemática publicada em agosto na revista Physical Review Letters.
“Ele está em pé de guerra”, comenta Wilczek que, imperturbável, revidou com um artigo postado em 27 de agosto no servidor de pré-impressão do arXiv na qual ele propõe uma nova forma para executar fisicamente a sua concepção.
Em seu sentido mais básico, o cristal do tempo proposto por Wilczek é qualquer coisa que possa ser observada movendo-se em um padrão que se repita a intervalos regulares ao longo do tempo sem o acréscimo de energia, essencialmente um relógio que funcione para sempre sem precisar de corda. Como os átomos em um cristal comum, que se repetem a intervalos discretos no espaço, a estrutura de um cristal do tempo se repete a intervalos discretos no tempo.
Ao procurar um exemplo para apoiar sua teoria, Wilczek idealizou um anel supercondutor em seu estado de menor energia. Os elétrons podem se mover por um anel desses sem resistência, fluindo em uma corrente perpétua que normalmente é suave e constante ao longo do tempo e, portanto, não tem uma referência (pontuação) observável para a passagem do tempo.
Em um artigo publicado em outubro de 2012, Wilczek levou a ideia um passo adiante ao imaginar um anel de partículas quânticas que interagem umas com as outras e formam aglomerações. Quando colocados em movimento por um campo magnético fraco, esses aglomerados oscilariam de um modo que satisfaria os critérios para um cristal do tempo.
A dissertação de Bruno questiona a ideia de que um sistema desses realmente está em seu estado de menor energia. Ele apresenta uma prova matemática de que qualquer sistema dessa natureza precisa receber alguma energia inicial para começar a girar. Mas ele argumenta que se as partículas não tiverem a energia mínima possível elas poderiam liberar alguma para se tornarem mais estáveis, rompendo assim o padrão de repetição de um cristal do tempo.
“Meu artigo encerra o assunto sobre cristais do tempo quânticos para uma classe bastante abrangente de sistemas”, afirma Bruno.
Uma equipe de físicos experimentais sediados nos Estados Unidos e na China discorda. Tongcang Li, da University of California em Berkeley e seus colegas estão planejando criar um cristal do tempo a partir de íons dispostos em um anel. Esses planos não mudaram apesar do artigo de Bruno. “O experimento que propusemos ajudará a resolver o debate”, declara Li.
De acordo com ele, Bruno pode ter adotado uma definição rigorosa demais para um cristal do tempo. Um sistema “metaestável”, que está quase em seu estado de menor energia, não existiria para sempre dizem os pesquisadores, mas poderia durar o tempo suficiente para ser interessante, levando talvez à criação de relógios que possam funcionar por um tempo muito longo sem qualquer estímulo.
Embora relute em desistir de sua ideia original, Wilczek admite que o conceito de um cristal do tempo talvez precise evoluir. “O assunto ainda está em um estágio exploratório e pode levar algum tempo para descobrir exatamente quais definições e sistemas são mais proveitosos”, diz ele.
Enquanto Li continua trabalhando com íons, a publicação mais recente de Wilczek descreve outro esquema, talvez mais simples, para fazer um cristal do tempo. Ele começa com dois pedaços de supercondutores conectados por um isolante não-supercondutor. Esse dispositivo, chamado de “Junção Josephson”, pode criar flutuações em correntes elétricas quando se aplica uma tensão externa. Wilczek argumenta que meramente quebrar o contato entre os supercondutores poderia criar os tipos de oscilações que caracterizam um cristal do tempo. Só o tempo dirá se isso satisfará seus críticos, e aonde tudo isso poderá levar.

Fonte: Nature

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Vórtices magnéticos armazenam informações

Físicos conseguiram amarrar e desamarrar vórtices magnéticos microscópicos que podem resultar em uma memória de computador mais eficiente.

vórtices torcidos na magnetização de uma superfície de metal

© U. hamburgo (vórtices torcidos na magnetização de um metal)

Esses vórtices torcidos (redemoinhos), conhecidos como skyrmions, são agrupamentos de átomos em que cada átomo age como uma barra magnética devido a uma propriedade quântica de seus elétrons, chamados spins. Um campo magnético externo normalmente tenderia a alinhar todos os átomos de uma barra magnética na mesma direção; mas no caso de um skyrmion a magnetização desses átomos está disposta em forma de um vórtice torcido.
Um skyrmion resiste a ser “desenrolado”, ou desfeito, porque, embora perturbações magnéticas possam alterar a disposição dos spins atômicos, elas não desfazem a torção.
Essa propriedade, chamada de estabilidade topológica, é compartilhada por objetos geométricos, como a fita de Möbius, uma forma que pode ser obtida juntando-se as duas extremidades de uma fita com uma meia torção no meio. Essa meia torção é “estável”, porque pode ser movida para lá e para cá, mas não pode ser desfeita, exceto se a fita for cortada, desenrolada e colada novamente.
A estabilidade topológica é atraente para os cientistas que procuram aprimorar os meios para transportar informações, diz Kristen von Bergmann, uma física da Universidade de Hamburgo, na Alemanha.
Os meios de armazenamento magnético convencionais, como a superfície de um disco rígido, contêm informações em forma de bits digitais, valores assinalados por “0” ou “1” que são representados pela magnetização dos átomos, por exemplo, com seu polo magnético Norte apontando para cima ou para baixo.
Mas quando eles são muito densamente carregados ou superaquecidos, essas magnetizações se tornam facilmente instáveis e ficam embaralhadas.
Um skyrmion oferece a possibilidade de armazenar informações de forma estável para que possam ser lidas novamente como um “0” ou um “1”, dependendo de se o nó magnético existe ou não. Para que isso funcione, porém, os cientistas precisam criar ou apagar skyrmions magnéticos conforme necessário. 
Embora a existência de skyrmions já tivesse sido prevista na década de 1960 pelo físico britânico Tony Skyrme, e desde então tenha sido demonstrada em materiais magnéticos, os pesquisadores não foram capazes de criar e apagá-los à vontade em um material magnético, até agora.
Escrevendo na revista Science, von Bergmann e seus colaboradores descrevem como criaram skyrmions em um fino filme magnético de paládio e ferro em um cristal de irídio.
Eles começaram com uma amostra em que todos os átomos dos ímãs em barra estavam alinhados.
Em seguida, a equipe usou a ponta de um microscópio de varredura por tunelamento (STM, na sigla em inglês) para aplicar uma pequena corrente de elétrons que tinham seus spins alinhados, ou polarizados, de um modo particular.
A corrente polarizada interagiu com os átomos dos ímãs em barra para torcê-los em configurações de skyrmions semelhantes a nós; cada um de apenas alguns nanômetros, ou cerca de 300 átomos de diâmetro, explica von Bergmann. Os cientistas também conseguiram usar a corrente polarizada para eliminar o nó, apagando o skyrmion.
Teoricamente, um dispositivo skyrmiônico poderia armazenar 20 vezes mais dados por unidade de superfície que os atuais discos rígidos, diz von Bergmann, mas adverte que a tecnologia ainda está muito longe de aplicações práticas.
A equipe conseguiu criar e apagar um total de quatro skyrmions de cada vez, mas a técnica só funcionou em cerca de 60% das tentativas, “o que é muito pouco para a tecnologia de dados”, observa von Bergmann.
Além disso, os pesquisadores só conseguiram controlar os skyrmions a 4,2 graus Kelvin, a temperatura do hélio líquido, o que não é uma temperatura de funcionamento prático para dispositivos eletrônicos.
Ainda assim, essa foi a primeira vez que cientistas criaram e apagaram skyrmions magnéticos individuais, diz Stefan Blügel, um físico de estados sólidos do Centro de Pesquisas Jülich, na Alemanha, acrescentando: “Com esse experimento poderemos criar skyrmions onde e quando os quisermos o que significa que poderemos imprimir um 1 ou um 0 de forma controlada”.
O mecanismo exato com que a corrente de spins torce e destorce o skyrmion continua um mistério, diz von Bergmann. Decifrá-lo exigirá novos experimentos e mais modelos teóricos.

Fonte: Nature

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O teletransporte da energia magnética

Os físicos, Carles Navau, Jordi Prat-Camps, e Alvaro Sanchez da Universidade Autônoma de Barcelona, ​​na Espanha, "desacoplaram" o magnetismo de sua fonte, o ímã, e transferiram esse magnetismo para outro ponto no espaço, onde ele atuou exatamente como se o ímã estivesse presente.

teletransporte do campo magnético

© Jordi Prat-Camps (teletransporte do campo magnético)

Uma propriedade geral dos campos magnéticos é que decaem com a distância a partir da sua fonte magnética. Mas neste novo estudo, os cientistas mostraram que em torno de uma fonte magnética com
um escudo magnético pode aumentar o campo magnético, uma vez que se afasta da fonte, permitindo transferir energia magnética para um local distante através do espaço vazio.

Ao inverter esta técnica, os cientistas demonstraram que a energia magnética transferida pode ser capturada por uma segunda camada magnética localizada a certa distância a partir da primeira camada. A segunda camada pode em seguida, concentrar a energia magnética capturada em uma pequena região interior. A conquista representa uma capacidade sem precedentes para transportar e concentrar a energia magnética e pode ter aplicações na transmissão sem fios, dos motores elétricos, do armazenamento digital de dados, de exames médicos como ressonância magnética, entre outras.

O escudo magnético poderia também ter aplicações médicas, tais como para biossensores que medem a do cérebro resposta em magnetoencefalografia, uma técnica utilizada para a atividade de mapeamento cerebral.

A base da técnica reside na óptica transformacional, um campo que lida com o controle de ondas eletromagnéticas e envolve metamateriais e mantos da invisibilidade. Enquanto os pesquisadores têm normalmente focado em utilizar a óptica transformacional para controlar a luz, aqui os pesquisadores aplicaram as mesmas ideias para controlar campos magnéticos através da concepção de um escudo magnético com propriedades eletromagnéticas específicas.
Os campos magnéticos isolados e estáticos apresentam deficiências, principalmente devido ao seu curto alcance; um campo magnético decai rapidamente conforme se distancia da sua fonte, enquanto campos eletromagnéticos podem ser transmitidos a grandes distâncias.

Atualmente, é impossível concentrar fortes campos magnéticos em pontos determinados do espaço, o que seria de grande valia para guiar partículas magnéticas dentro do corpo humano para efetuar tratamentos localizados. Os concentradores podem ser fabricados com materiais largamente disponíveis, como ferromagnetos e supercondutores.

Novas soluções para o eletromagnetismo clássico surgirão, criando novos enfoques e possibilidades.

Fonte: Physical Review Letters

sábado, 11 de agosto de 2012

Congelamento de monopolos magnéticos

Os monopolos magnéticos são entidades onde o pólo norte e sul magnéticos estão separados, e não deveriam existir.

monopolo magnético

© Discovery (monopolo magnético)

Se você tentar dividir um ímã de barra no meio, tudo que você conseguirá são dois ímãs, cada um com um pólo norte e sul. Em anos recentes, no entanto, a existência de monopolos, pelo menos sob a forma de "quasipartículas" consistindo de excitações coletivas entre muitos átomos, foi prevista e demonstrada em laboratório. Agora Stephen Powell, um cientista do Joint Quantum Institute (JQI) e da Universidade de Maryland, tem aguçado o quadro teórico em que os monopolos podem operar. Os fluxos estáveis ​​de monopolos magnéticos são aparentemente impossíveis, mas as correntes transitórias têm sido demonstradas, e se poderia imaginar a criação de uma corrente alternada, o equivalente magnético da eletricidade, chamada de “magnetricidade”, que pode ser explorada para a concepção de novos tipos de alta densidade de armazenamento de dados. As leis do eletromagnetismo preveem uma simetria muito grande entre forças elétricas e magnéticas. Esta igualdade não se estende, no entanto, as cargas magnéticas. As cargas elétricas isoladas, sob a forma de elétrons, são evidentemente muito comuns. Estas cargas são atraídas ou repelidas mutuamente, com uma força inversamente proporcional ao quadrado da distância entre as cargas. Uma carga positiva e uma carga negativa pode se juntar para formar um dipolo elétrico neutro. A situação no magnetismo parece diferente: dipolos sim, monopolos não. Mas novas idéias e novas experiências mudaram o pensamento convencional. Primeiro, as experiências com os elétrons frios fluindo em uma superfície bidimensional pode, sob a ação de poderosos campos magnéticos, serem estimulados a se moverem em órbitas circulares. Estas órbitas, por sua vez parecem interagir na produção de "quasipartículas" que têm uma carga igual a uma fracção da carga do elétron convencional. Este é o efeito Hall quântico fracionário.

Poderia haver um análogo de dipolos magnéticos? Poderia as circunstâncias permitem a existência dos pólos magnéticos isolados?

As experiências recentes e na Alemanha e na França apontam para esta possibilidade, o denominado "gelo de spin", um material sólido feito de elementos do disprósio (Dy), titânio (Ti), oxigênio (O). O bloco básico de construção destes materiais é um par de agrupamentos tetraédricos, constituído tipicamente de dois átomos de Dy (cada um dos quais atua como um ímã diminuto) apontando para fora de cada tetraedro e dois apontando para dentro. Isto é análogo ao da orientação de átomos de hidrogênio em gelo de água, daí o nome de "gelo de spin".

representação do gelo de spin

© Stephen Powell (representação do gelo de spin)

Normalmente todos os pólos magnéticos devem ser confinados dentro de dois pólos distintos, o dipolo magnético tradicional. No entanto, a uma temperatura suficientemente baixa, cerca de 5 K (kelvin), os átomos tentam se alinharem entre si, mas não podem por causa da geometria inerente do material conduzindo a um estado desordenado com flutuações fortes, sincronizados. Os pólos magnéticos separados podem se formar no meio deste tumulto, ou seja, as "quasipartículas" no gelo de spin com uma rede de "carga" magnética podem existir e se movimentarem. Um gás de cargas elétricas é chamado de "plasma", e a nuvem tênue análoga de cargas magnéticas é chamada de  "plasma monopolo."

Esta nova pesquisa explora o que acontece quando as flutuações são congeladas, por exemplo, em temperaturas ainda mais frias, ou em um elevado campo magnético. Mostra também como os monopolos estão confinados em dipolos magneticamente neutros novamente. Este estudo é o primeiro a prescrever a transição de fase a partir da fase de monopolo (também chamada de fase de Coulomb) para a fase de pólo confinado.

Fonte: Physical Review Letters

sexta-feira, 23 de março de 2012

Mecanismo insensível aos campos magnéticos

Pesquisadores europeus criaram um mecanismo insensível a campos magnéticos, com aplicações potenciais nos setores militar e médico.

invisibilidade magnética

© Alvaro Sanchez (invisibilidade magnética)

Este avanço consiste na criação de campos magnéticos estáticos gerados por um ímã permanente ou de uma bobina atravessada por uma corrente elétrica. Estes campos já são utilizados nas imagens médicas de MRI (ressonância magnética) e em muitos sistemas de segurança usados em aeroportos.

O dispositivo desenvolvido por estes pesquisadores, entre eles Alvaro Sanchez, da Universidade Autônoma de Barcelona, na Espanha, é um cilindro com duas camadas concêntricas: a camada interior, constituída por um material supercondutor, repele os campos magnéticos, enquanto a camada exterior, de material ferromagnético, os atrai.

Colocado em um campo magnético, o cilindro não o perturba, não produz nem "sombra" nem "reflexo". Assim, um objeto colocado em seu interior não será detectado magneticamente ficando, portanto, insensível ao campo magnético, explicou Sanchez, que usa a palavra "invisibilidade" para se referir ao processo.

Como o dispositivo é feito de materiais comercialmente disponíveis e funciona em campos magnéticos relativamente fortes, ele pode, segundo os autores, ser facilmente implementado.

Este sistema pode proteger uma pessoa com marcapasso, sensível às ondas eletromagnéticas, quando precisar passar por um exame de ressonância magnética, por exemplo.

Também pode atuar como um escudo magnético ao redor de um submarino e de alguns equipamentos sensíveis ao campo eletromagnético.

Os trabalhos realizados por estes pesquisadores diferem daqueles feitos nos últimos anos com metamateriais - materiais compósitos artificiais - projetados para não refletir os raios de luz.

A luz flui sobre eles como água sobre a rocha, fazendo com que se torne invisível. Até agora, os metamateriais criados apenas obtinham uma invisibilidade parcial, ressaltam os autores dos trabalhos publicados.

Fonte: Science

domingo, 4 de março de 2012

Ondas de rádio torcidas em múltiplos canais

Um grupo de pesquisadores italianos e suecos parece ter resolvido o problema do congestionamento dos canais de transmissão de dados via rádio ou transmissões wireless.

ondas eletromagnéticas torcidas

© Revista Física (ondas eletromagnéticas torcidas)

Celulares, internet sem fio e TVs digitais estão provocando um esgotamento rápido do número de frequência de rádio disponíveis para transmitir informações, embora a adoção da era digital esteja longe de atingir seu potencial.

A saída pode ser trançar as ondas de rádio, girando-as em seu próprio eixo, até que elas assumam o formato da rosca de um parafuso.

Uma onda pode ser girada ao redor de seu eixo um certo número de vezes, tanto no sentido horário quanto anti-horário, o que permite montar inúmeras configurações de ondas diferentes, que podem compartilhar a mesma banda de transmissão, ou a mesma frequência.

Agora, Fabrizio Tamburini e seus colegas das universidades de Pádua (Itália) e Uppsala (Suécia) demonstraram que isso também é possível de se fazer na prática com as ondas de rádio.

As ondas de rádio torcidas permitem que um número praticamente infinito de canais possa ser transmitido e recebido em uma mesma área. O mecanismo funciona para rádio, TV e WiFi.

Para demonstrar a técnica, a equipe transmitiu ondas de rádio torcidas, na banda de 2,4 GHz, por uma distância de 442 metros, entre uma casa na Ilha de São Jorge e um prédio na região continental de Veneza, na Itália.

Os dois canais inseridos na transmissão foram detectados e separados perfeitamente.

"É possível usar a multiplexação, como na TV digital, em cada um dos feixes, para implementar ainda mais canais nos mesmos estados, o que significa que se pode obter 55 canais na mesma banda de frequência," disse Tamburini.

A descoberta tem efeitos também na astrofísica.

Os buracos negros, por exemplo, estão girando constantemente. Conforme as ondas passam por eles, elas são forçadas a girar, alinhando-se com o buraco negro.

De posse dos novos cálculos, os astrofísicos poderão tirar mais informações da luz captada, em diversos comprimentos de onda, vinda desses e de outros corpos celestes.

"Nós descobrimos que isso cria um novo efeito relativístico que estampa um momento angular orbital nessa luz," afirma o grupo, em um outro artigo que estabelece os fundamentos teóricos da descoberta.

Fonte: New Journal of Physics e Nature Physics

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Leis da Física variam ao longo do Universo

Uma pesquisa afirma que as leis da natureza podem variar ao longo do Universo.

variação da constante alfa

© John Webb (variação da constante alfa)

O gráfico mostra medições feita pelo telescópio Keck e VLT (Very Large Telescope). Os quadrados são dados do VLT, os círculos do Keck, e os triângulos são quasares observados em ambos.

O estudo concluiu que uma das quatro forças fundamentais, o eletromagnetismo, parece variar de um lugar para outro.

O eletromagnetismo é medido por meio da chamada constante de estrutura fina, simbolizada pela letra grega alfa (α).

Esta constante é uma combinação de três outras constantes: a velocidade da luz (c), a carga do elétron (e) e a constante de Planck (h), onde α = e2/hc.

O resultado é cerca de 1/137, um número sem dimensão, o que a torna ainda mais fundamental do que as outras constantes, como a gravidade, a velocidade da luz ou a carga do elétron.

Em termos gerais, a constante alfa mede a magnitude da força eletromagnética, ou seja, a intensidade das interações entre a luz e a matéria.

Agora, John Webb e pesquisadores das universidades de Nova Gales do Sul e Swinburne, na Austrália, e Cambridge, no Reino Unido, mediram o valor de alfa em cerca de 300 galáxias distantes, usando dados do VLT do ESO, no Chile.

Observaram que numa direção, a partir de nossa localização no Universo, a constante alfa vai ficando gradualmente mais fraca, e gradualmente mais forte na direção oposta.

Isso mostra uma espécie de "eixo preferencial" para o Universo, de certa forma coincidente com medições anteriores que deram origem à teoria do chamado Fluxo Escuro, que indica que uma parte da matéria do nosso Universo estaria vazando por uma espécie de "ralo cósmico", sugada por alguma estrutura de um outro universo.

A descoberta, se confirmada, terá profundas implicações para o nosso entendimento do espaço e do tempo, e viola um dos princípios fundamentais da teoria da Relatividade Geral de Einstein, o princípio da equivalência de Einstein.

Essas violações são de fato esperadas por algumas “teorias de tudo”, que tentam unificar todas as forças fundamentais. Uma alteração suave e contínua de alfa pode implicar que o Universo seja muito maior do que a parte dele que conseguimos observar, possivelmente infinito.

O professor Webb afirma que esta descoberta também pode dar uma resposta muito natural para uma questão que tem intrigado os cientistas há décadas: por que as leis da física parecem tão bem ajustadas para a existência da vida?

"A resposta pode ser que outras regiões do Universo não são tão favoráveis à vida como nós a conhecemos, e que as leis da física que medimos em nossa parte do Universo são meramente 'regras locais'. Neste caso, não seria uma surpresa encontrar a vida aqui," afirma o cientista.

Isto porque basta uma pequena variação nas leis da física para que, por exemplo, as estrelas deixem de produzir carbono, o elemento básico da vida como a conhecemos.

Para chegar às suas conclusões, os cientistas usaram a luz de quasares muito distantes como faróis.

O espectro da luz que chega até nós, vinda de cada quasar, traz consigo sinais dos átomos nas nuvens de gás que a luz atravessou em seu caminho até a Terra.

Isto porque uma parte da luz é absorvida por estes átomos, em comprimentos de onda específicos que revelam a identidade desses átomos.

Essas linhas de absorção são então comparadas com as mesmas assinaturas encontradas em laboratório aqui na Terra para ver se a constante alfa é mesmo constante.

Os resultados mostraram que não, que alfa varia ao longo de um eixo que parece atravessar o Universo, assim como um eixo magnético atravessa a Terra.

Se há variação em uma das constantes, é de se esperar que as outras constantes fundamentais também variem.

Portanto, é preciso projetar experimentos que possam verificar variações na gravidade, na carga do elétron ou na velocidade da luz.

Fonte: Physical Review Letters

quinta-feira, 30 de junho de 2011

O maior campo magnético é criado

Foi batido um novo recorde mundial para os campos magnéticos por físicos alemães, ao alcançar a marca dos 91,4 T (teslas).
bobina dupla
© Helmholtz-Zentrum (bobina dupla)
Para alcançar este recorde, Sergei Zherlitsyn e seus colegas do Centro Helmholtz desenvolveram uma bobina pesando aproximadamente 200 quilogramas.
Ao percorrer a bobina, uma fortíssima corrente elétrica cria o campo magnético, por um período de alguns milissegundos, sob risco de explodir a própria bobina.
O campo magnético influencia a própria corrente elétrica que o gera, tentando empurrar a corrente elétrica para fora da bobina. Quanto mais forte a corrente flui, mais fortes são essas forças.
"A 25 tesla, o cobre seria dilacerado," explica Joachim Wosnitza, que construiu a bobina. Para comparação, um ímã de geladeira comum tem 0,05 tesla.
"Apesar do recorde, não estamos realmente muito interessados em alcançar valores de campo cada vez mais altos, mas sim em usá-los para a pesquisa em ciência dos materiais", explica o pesquisador.
Quanto mais poderosos forem os campos magnéticos, mais precisamente os cientistas poderão estudar novos materiais para a construção de componentes eletrônicos inovadores, ou os chamados supercondutores, que conduzem eletricidade sem qualquer resistência.
Técnicas assim permitiram que a mesma equipe fizesse com que o semicondutor germânio se tornasse supercondutor a temperatura ambiente.
Os teóricos estimam que o estudo e a manipulação precisa desses novos materiais exigirão campos magnéticos entre 90 e 100 teslas.
A 100 teslas, porém, a força de Lorentz no interior do cobre poderia gerar uma pressão que equivale a 40.000 vezes a pressão do ar ao nível do mar.
banco de capacitores
© Helmholtz-Zentrum (banco de capacitores)
Uma força assim destruiria o cobre de forma instantânea, em uma explosão.
Por isso, para construir suas bobinas, os pesquisadores usam ligas de cobre especiais, capazes de suportar 10 mil vezes a pressão atmosférica.
Ainda muito pouco, sendo apenas um quarto do necessário para alcançar os 100 teslas.
A primeira saída encontrada foi unir os fios de cobre da bobina com fibras sintéticas de carbono, usadas em coletes à prova de balas, que pressionam o cobre de fora para dentro.
Isso permite construir uma bobina que alcança por volta de 50 teslas.
Para obter os 91,4 teslas do maior campo magnético já gerado, os pesquisadores construíram duas bobinas, colocando uma dentro da outra.
Ainda assim, o aparato só funciona durante alguns milissegundos, consumindo a energia fornecida por um gigantesco banco de capacitores.
Fonte: Helmholtz-Zentrum

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Ímã líquido gera magnetismo pelo movimento

A Terra, o Sol e outros corpos celestes geram campos magnéticos através do movimento dos seus fluidos internos condutores de eletricidade.
geodínamo
© Los Alamos National Laboratory (geodínamo)
Estes fluidos são frequentemente muitíssimo turbulentos.
Mas pode ser possível gerar magnetismo em um fluido que flui com suavidade, por exemplo, em um tanque de sódio líquido posto para girar suavemente.
Uma equipe de físicos anunciou ter alcançado uma amplificação de oito vezes de um campo magnético promissor. Na próxima fase de seu projeto, eles esperam demonstrar um campo magnético auto-sustentável, como ocorre na Terra, assim como em todos os planetas e estrelas.
Na última década, pesquisadores conseguiram criar campos magnéticos em laboratório usando os chamados dínamos fluidos. Assim como seus equivalentes astronômicos, esses sistemas são baseados na rotação de um fluido, tipicamente o sódio, devido à sua alta condutividade.
Um pequeno campo magnético inicial, aplicado ao tanque com o sódio em rotação, pode gerar uma corrente elétrica.
Esta, por sua vez, gera mais campo magnético, criando um círculo virtuoso que pode levar a um crescimento exponencial do campo.
Em vez de discutir as complexas interações corrente-campo magnético, os pesquisadores frequentemente descrevem essa amplificação como um processo de alongamento e dobramento das linhas do campo magnético, que são essencialmente arrastadas pelo fluido.
Mas não tem havido consenso nessas explicações. Alguns pesquisadores argumentam que o reforço do campo magnético é gerado pela turbulência, que cria vórtices capazes de realimentar o processo.
Outros, porém, argumentam que a turbulência é aleatória - dessa forma, alguns turbilhões atuarão no sentido da amplificação, enquanto outros terão o efeito oposto, tornando o campo magnético mais difuso e mais fraco.
Stirling Colgate e seus colegas do Laboratório Nacional Los Álamos, nos Estados Unidos, decidiram então partir para trabalhar com dínamos fluidos sem turbulência, nos quais o sódio é girado suavemente, de maneira contínua e previsível.
Isso permitirá descrever com bastante precisão o papel da turbulência nesses processos essenciais ao "funcionamento do cosmos".
O fluido está dentro de um tanque em forma de anel, de 30 centímetros de altura, cujo raio interno é metade do raio externo.
Em vez de usar hélices, o fluido é rotacionado girando as paredes do tanque. A parede interna gira a 68 rotações por segundo, enquanto a parede externa gira um quarto mais rápido.
Esse fluxo suave reproduz o que se acredita acontecer no interior das estrelas jovens e ao redor dos buracos negros.
No último experimento, a equipe aplicou um campo magnético de cerca de 12 G (gauss), apontando radialmente para dentro.
Como era de se esperar de um líquido condutor de eletricidade, o sódio "agarrou" as linhas do campo magnético e as fez girar em torno do tanque em forma de anel.
Este envolvimento e alongamento, que é chamado de efeito Ômega, criou um campo magnético na direção do fluxo do sódio que chegou a ser oito vezes mais forte do que o campo original.
Mas o efeito Ômega não é suficiente para que um campo magnético se auto-sustente. Para completar o dínamo, a equipe vai precisar dobrar uma parte do campo amplificado na direção radial original.
Isto poderá ser feito pelo chamado efeito Alfa, que resulta de movimento helicoidal do fluido.
A turbulência, com os seus redemoinhos espirais, é uma fonte natural de movimento helicoidal, mas o grupo espera criar um efeito Alfa suave, sem turbulência, disparando jatos de sódio a partir do fundo do tanque rotativo.
"A mensagem importante em termos de física é que os fluxos laminares podem produzir campos magnéticos em grande escala mais facilmente do que os fluxos turbulentos," comentou Cary Forest, da Universidade de Wisconsin, que trabalha em outro experimento de dínamo fluido.
Mas o próprio Forest salienta que a turbulência tem sido observada nos dínamos estelares e galácticos. Outros pesquisadores admitem que a turbulência diminui a eficiência dos dínamos fluidos, mas que a turbulência, seria inevitável.
O projeto Alfa-Ômega pode tirar essas dúvidas. E, se Fores e outros tiverem razão, exatamente por não reproduzir com naturalidade os processos que ocorrem nas estrelas e nos planetas, o experimento poderá revelar o peso que a turbulência exerce neles. E, também, será possível gerar campos magnéticos de alta potência, eventualmente com diversas aplicações práticas.
Fonte: Physical Review Letters

domingo, 15 de maio de 2011

Velocidade da luz é alterada por campo eletromagnético

A luz não viaja na mesma velocidade em todas as direções quando ela está sob o efeito de um campo eletromagnético.
raios de luz
© Revista Física (concepção artística de raios de luz)
Embora tenha sido previsto pela teoria, esse efeito contra-intuitivo foi agora demonstrado experimentalmente pela primeira vez por uma equipe da Universidade Paul Sabatier e do Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS), da França.
Os pesquisadores mediram, com uma precisão extrema - de cerca de um bilionésimo de metro por segundo - a diferença entre as velocidades de propagação da luz em uma direção e na direção oposta.
A diferença encontrada abre caminho para pesquisas mais aprofundadas com o objetivo de melhorar o modelo que descreve as interações das partículas elementares, o chamado Modelo Padrão da Física.
No vácuo absoluto, a luz viaja a uma velocidade constante de 299.792.458 m/s.
Parece natural que ela se propagasse na mesma velocidade em todas as direções.
No entanto, existem situações em que essa propriedade não é válida, principalmente quando a luz está viajando sob o efeito de um campo eletromagnético.
Esses casos foram inicialmente previstos pela teoria no final dos anos 1970, e deveriam ser observados mesmo no vácuo. No entanto, essas variações muito pequenas são difíceis de confirmar experimentalmente.
O progresso tecnológico tornou possível a detecção desses efeitos em um gás, o nitrogênio no caso do experimento agora realizado.
Para observar a variação da velocidade da luz, os pesquisadores projetaram uma cavidade óptica na qual os feixes de luz passam através de um dispositivo composto por ímãs e eletrodos, o que torna possível a geração de intensos campos elétricos e magnéticos - o campo magnético aplicado é 20.000 vezes maior do que a da Terra.
cavidade óptica usada no experimento 
© CNRS (cavidade óptica usada no experimento)
Uma cavidade óptica é um dispositivo no qual determinados raios de luz permanecem confinados por meio de espelhos, nos quais esses raios ficam refletindo continuamente.
Dessa forma, os pesquisadores conseguiram demonstrar experimentalmente que a luz não viaja na mesma velocidade em direções opostas em um gás sobre o qual está atuando um campo eletromagnético.
A diferença medida na velocidade da luz é de cerca de um bilionésimo de metro por segundo (m/s), ou seja, 10-9 m/s, o que equivale a 10-18 vezes a velocidade da luz.
Os resultados abrem caminho para diversas novas pesquisas. Permitirão um refinamento das medições da anisotropia da propagação da luz. Aumentando a sensibilidade do dispositivo de medição poderá ser observado minúsculas falhas da invariância de Lorentz, que é uma simetria fundamental expressa como parte da Teoria da Relatividade.
Isso tornaria possível testar algumas propostas teóricas para melhorar o Modelo Padrão, um modelo que hoje descreve todas as interações entre as partículas elementares.
Essa anisotropia direcional, governada por um campo eletromagnético, pode gerar novas aplicações em óptica, tais como componentes cujo comportamento será diferente dependendo da direção, tudo controlado por um campo magnético externo.
Fonte: Physical Review Letters

sábado, 7 de maio de 2011

A misteriosa supercondutividade

A supercondutividade é um dos poucos fenômenos naturais a reunir virtualmente todas as facetas do desenvolvimento científico e tecnológico.
 supercondutor repelindo as linhas de força de um campo magnético
© LPS (supercondutor repelindo um campo magnético)
Na descrição do fenômeno mede-se a resistência elétrica do material em função da temperatura. Quando esta decresce, o valor da resistência varia suavemente até que, em determinada temperatura, ele cai abruptamente a zero. A temperatura em que isso ocorre é conhecida como temperatura crítica (Tc) do material observado. Diz-se então que o material é supercondutor abaixo dessa temperatura.
Mas, no alvorecer de seu primeiro centenário, a supercondutividade permanece envolta em mistério e ainda não permitiu que a humanidade a utilizasse em muitas das suas tão sonhadas e plausíveis aplicações tecnológicas.
Como é usual acontecer com as grandes descobertas, a da supercondutividade resultou de um conjunto de eventos fortuitos conduzidos e observados por cientistas. No início do século passado, o físico holandês Heike Kamerlingh Onnes (1853-1926) dedicava-se à liquefação do hélio para obter temperaturas próximas do zero absoluto – ou zero Kelvin (0 K). Conseguiu a façanha em 1908, obtendo a temperatura de 4,2 K, o que lhe valeu o Prêmio Nobel de Física de 1913.
A motivação para a obtenção de temperaturas tão baixas era, principalmente, o estudo da resistência elétrica dos metais em função da temperatura. De acordo com o conhecimento da época, para levar adiante esses estudos seria preciso usar amostras metálicas de alta pureza.
O físico holandês Gilles Holst (1886-1968), um dos colaboradores de Onnes, teve a ideia de usar mercúrio em vez de um metal. Por se tratar de um líquido, a purificação do mercúrio era uma tarefa banal. Então, no dia 8 de abril de 1911, eles colocaram um tubo capilar cheio de mercúrio no hélio líquido e mediram a resistência elétrica do material em função da temperatura: a 4,2 K, a resistência era tão pequena que não podia ser medida. Estava descoberta a ‘supracondução’, primeiro termo usado por Onnes para descrever o fenômeno.
Ironicamente, tudo poderia ter sido muito mais simples. Bastaria ter colocado um pedaço qualquer de chumbo, impuro que fosse, e observariam o fenômeno em temperatura por volta de 7,2 K. Mas apenas em 1913 eles fizeram o experimento com esse metal.
Além disso, havia outro incômodo na supercondutividade: o estado de resistência zero desaparecia quando a amostra era colocada nas proximidades de um campo magnético, por mais fraco que fosse esse campo.
Sabe-se hoje que a explicação para isso é que vários supercondutores descobertos naquela época eram metais elementares, muitos deles supercondutores do tipo I. Nesses metais, o estado supercondutor existe apenas em uma fina camada superficial e é facilmente destruído por campos magnéticos acima de determinado valor que penetram no material.
Passaram-se duas décadas até que a existência de supercondutividade em ligas metálicas fosse reconhecida. Era o nascimento dos supercondutores do tipo II, com temperaturas críticas maiores e estado supercondutor distribuído em grande volume da amostra, de modo que o material resistia mais à presença de campos magnéticos.
Essa interação entre estado supercondutor e campo magnético foi bem investigada pelos físicos alemães Walther Meissner (1882-1974) e Robert Ochsenfeld (1901-1993), que, em 1933, descobriram o efeito Meissner, uma das principais assinaturas do estado supercondutor. O fenômeno está associado à capacidade que um material supercondutor tem de repelir as linhas de força de um campo magnético.
Depois da descoberta do efeito Meissner, o grande salto na pesquisa sobre supercondutividade ocorreu no final dos anos 1950, quando os físicos estadunidenses John Bardeen (1908-1991), Leon Cooper (1930-) e Robert Schrieffer (1931-) apresentaram a hoje famosa teoria BCS, que lhes valeu o Prêmio Nobel de Física de 1972. Um componente importante dessa teoria é a formação de pares de elétrons, os famosos pares de Cooper, responsáveis pela condução elétrica nos supercondutores.
Se a comunidade científica recebeu com grande entusiasmo a teoria BCS, não havia como esconder a frustração pela falta de aplicações tecnológicas da supercondutividade. Mas essa conquista ocorreu poucos anos depois, com a fabricação de fios supercondutores de Nb3Sn, NbZr e NbTi, que ainda hoje são usados nos equipamentos de ressonância magnética de laboratórios de pesquisa e de hospitais e nos eletroímãs do Grande Colisor de Hádrons (LHC), por exemplo.
Ao mesmo tempo em que os pesquisadores experimentais avançavam na elaboração de supercondutores do tipo II, por volta de 1962, o físico teórico britânico Brian Josephson (1940-) previu a existência do efeito túnel em materiais supercondutores.
Esse fenômeno resultou na invenção do Squid (dispositivo supercondutor de interferência quântica). Trata-se de um sensor que permite realizar medidas magnéticas extremamente sensíveis e é usado atualmente em inúmeros equipamentos de pesquisa e em inovadores aparelhos clínicos de magnetoencefalograma, magnetocardiograma e ressonância magnética funcional.
Nos anos 1970, o avanço científico e tecnológico associado à supercondutividade era tão lento que muita gente foi se dedicar a outras áreas de pesquisa. A história mudou em meados de 1986, com a descoberta das cerâmicas supercondutoras, algumas das quais apresentando supercondutividade abaixo de 90 K.
Encontrar um material supercondutor com temperatura crítica próxima da temperatura do nitrogênio líquido (77 K) foi um grande passo em direção ao sonho supremo da supercondutividade em temperatura ambiente (entre 294 e 296 K). Mas ninguém sabe se chegaremos lá. Na verdade, ainda estamos muito longe: o recorde atual, 138 K, pertence a um óxido à base de mercúrio, bário, cálcio e cobre.
Enquanto as cerâmicas supercondutoras não satisfazem completamente o sonho dos engenheiros, os pesquisadores da área de ciência dos materiais avançam na descoberta de compostos supercondutores, sendo o diboreto de magnésio (MgB2) o mais novo da família. Comparado com as cerâmicas, ele é medíocre em termos de temperatura crítica (39 K), mas seu estado supercondutor resiste a altíssimos campos magnéticos, o que o credencia para a indústria elétrica de alta potência.
Fonte: Ciência Hoje

terça-feira, 26 de abril de 2011

Energia solar sem células fotovoltaicas

Um dramático e surpreendente efeito magnético da luz pode gerar energia solar sem as tradicionais células solares fotovoltaicas.
ilustração do magnetismo da luz
© Science (ilustração do magnetismo da luz)
O cientista Stephen Rand, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, e seus colegas descobriram que, na intensidade certa, quando a luz viaja através de um material que não conduz eletricidade, o campo de luz pode gerar efeitos magnéticos que são 100 milhões de vezes mais fortes do que o anteriormente esperado.
Nestas circunstâncias, os efeitos magnéticos da luz apresentam uma intensidade equivalente à de um forte efeito elétrico.
Isso pode permitir a construção de um novo tipo de célula solar sem semicondutores e sem absorção para produzir a separação de cargas. Nas células solares, a luz entra em um material, é absorvida e gera calor.
"Aqui, esperamos ter uma carga térmica muito baixa. Em vez de a luz ser absorvida, a energia é armazenada como um momento magnético. A magnetização intensa pode ser induzida por luz intensa e, em seguida, é possível fornecer uma fonte de energia capacitiva," explica o pesquisador.
O que torna isto possível é uma espécie de "retificação óptica" que nunca havia sido detectada, afirma William Fisher, coautor da pesquisa.
Na retificação óptica tradicional, o campo elétrico da luz provoca uma separação de cargas, distanciando as cargas positivas das negativas no interior de um material. Isto cria uma tensão elétrica, semelhante à de uma bateria.
Este efeito elétrico só havia sido detectado em materiais cristalinos, cuja estrutura atômica apresenta uma certa simetria.
Rand e Fisher descobriram que, sob certas circunstâncias, o campo magnético da luz também pode criar retificação óptica em outros tipos de material.
"Acontece que o campo magnético começa desviando os elétrons, forçando-os a assumir uma rota em formato de C, e fazendo-os avançar aos poucos. Esse movimento das cargas em formato de C gera tanto um dipolo elétrico quanto um dipolo magnético. Se pudermos configurar vários desses elementos em linha ao longo de uma fibra poderemos gerar uma tensão enorme; extraindo essa tensão, podemos usar a fibra como uma fonte de energia," disse Fisher.
Para isso, a luz deve ser dirigida através de um material que não conduz eletricidade, como o vidro. E ela deve ser focalizada a uma intensidade de 10 milhões de watts por centímetro quadrado.
A luz do Sol sozinha não é tão intensa, mas o cientista afirma que seu grupo está procurando materiais que trabalhem com intensidades mais baixas. Por outro lado, concentradores solares de alta eficiência já conseguem aumentar a concentração da luz em quase 2.000 vezes.
Num trabalho recente, os pesquisadores mostraram que uma luz incoerente como a luz solar é teoricamente quase tão eficiente em produzir a separação de cargas quanto a luz de um laser.
Esta nova técnica poderia tornar a energia solar mais barata. Eles preveem que, com materiais melhores, será possível alcançar uma eficiência de 10 por cento na conversão da energia solar em energia utilizável. Isso é praticamente equivalente à eficiência das células solares vendidas no comércio hoje, embora já existam células solares muito mais eficientes em escala de laboratório.
Fonte: Journal of Applied Physics

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Magnetismo da luz é medido diretamente

A luz é uma onda contendo tanto campos elétricos quanto magnéticos, mas quando essas ondas atingem a matéria é quase impossível detectar diretamente o efeito muito mais fraco do componente magnético.
onda de luz estacionária
© D. van Oosten/AMOLF (onda de luz estacionária)
A imagem mostra uma onda de luz estacionária que é gerada no interior de uma cavidade fotônica, com picos de campo magnético (azul) e elétrico (vermelho).
Agora, dois grupos de pesquisa independentes demonstraram que uma minúscula sonda metálica interage fortemente com o campo magnético de ondas de luz presas em uma espécie de "caixa" semicondutora, permitindo sua medição direta pela primeira vez.
A técnica poderá ser usada para medir as propriedades magnéticas de alta frequência de objetos em escala nanométrica, ou para mapear o campo magnético no interior dos chamados metamateriais, que podem controlar a luz de maneiras inusitadas.
Quando a luz interage com a matéria, o resultado dominante é frequentemente uma vibração dos elétrons para cima e para baixo em resposta ao campo elétrico. Essa interação é aproximadamente 10.000 vezes maior do que a ação girante do campo magnético de uma onda de luz.
A situação é diferente com os metamateriais, que contêm componentes minúsculos, como anéis metálicos, que são frequentemente ajustados para apresentar uma resposta otimizada aos campos magnéticos. Graças a essa sensibilidade, a luz que viaja através de um metamaterial pode se curvar de maneiras inusitadas, viabilizando dispositivos como lentes perfeitas e mantos da invisibilidade.
Anteriormente, os pesquisadores podiam medir a interação magnética entre a luz e alguma forma de matéria apenas subtraindo a interação elétrica dominante a partir do efeito total da luz.
Agora, o efeito do campo magnético foi isolado diretamente, através de um tipo de dispositivo bidimensional chamado microcavidade de cristal fotônico.
O cristal é fabricado perfurando-se pequenos orifícios ordenados em uma fina tira de material semicondutor, criando uma espécie de microcartão perfurado. A cavidade é feita deixando uma pequena região sem perfurações e fazendo a rede de buracos ao seu redor funcionar como paredes espelhadas que mantêm a luz infravermelha circulando ao redor da cavidade como se fossem ondas estacionárias.
Nos últimos anos, pesquisadores vêm caracterizando a luz aprisionada em cavidades fotônicas colocando a ponta afilada de uma fibra óptica a poucos nanômetros da superfície. Esta sonda perturba o campo elétrico e muda a luz aprisionada para comprimentos de onda mais longos.
Os novos experimentos usaram uma fibra óptica com a ponta recoberta por uma fina camada de alumínio, exceto sua extremidade final. Esse "tubo" de metal funciona como um anel de algumas centenas de nanômetros de diâmetro.
As duas equipes ficaram inicialmente surpresas ao descobrir que esses anéis metálicos causam um deslocamento para o azul da luz aprisionada.
Mais tarde eles perceberam que, segundo a eletrodinâmica clássica, o campo magnético oscilante da luz induz uma corrente no anel metálico, que por sua vez cria um campo magnético secundário que aponta na direção oposta à da direção do campo original.
Este campo secundário anula uma parte do campo magnético no interior da cavidade e, assim, reduz o volume disponível para a luz aprisionada. Menos volume significa comprimentos de onda menores, mais azuis. A variação para o azul foi de cerca de 0,03 por cento. Seu grupo combinou esse resultado com uma estimativa para o campo magnético máximo da cavidade para obter as propriedades magnéticas do seu nanoanel metálico.
Assim, os autores sugerem que esse método poderia ser usado para medir a resposta magnética de outros pequenos objetos, como os nanotubos de carbono ou mesmo átomos individuais. Eles também realizaram recentemente uma variante deste experimento, no qual usaram uma ponta com um anel aberto para estudar o campo magnético da luz em propagação, não aprisionada.
O outro experimento foi similar, exceto que foi recolhido diferentes informações da interação magnética. Em vez de medir as propriedades do anel, foi movimentada a ponta óptica revestida de metal sobre a superfície do cristal fotônico para construir uma imagem mostrando os padrões espaciais do campo magnético.
As experiências são comparáveis ao trabalho de Heinrich Hertz, no final do século 19, que usou uma antena em formato de anel para mapear os campos magnéticos das ondas de rádio.
Foi apenas em 2009 que os cientistas construíram pela primeira vez um sensor para visualizar o magnetismo da luz.
Estas novas técnicas de sondagem provarão ser muito úteis na fabricação de novos dispositivos ópticos.
Fonte: Physical Review Focus